"...Segurança na Aviação e no Trabalho, o objetivo é o mesmo?"

Segurança Operacional X Segurança Ocupacional

Segurança na Aviação e no Trabalho, o objetivo é o mesmo?


Ao tomar conhecimento de algum acidente, seja esse onde for, como foi, quais são as vítimas, enfim, um número considerável de variáveis vem à nossa mente e, sem dúvida, ficamos ansiosos por saber o que de fato ocorreu e em qual sentido, momento, fase ou tipo do voo e tantos outros fatores, e porque a segurança daquela atividade não conseguiu minimizar ou evitar a ocorrência, independentemente das lesões e danos causados.


Na eventualidade de haver acesso ao local da ocorrência ou mesmo que esta sejam centenas de peças espalhadas, as quais teremos que resgatar cada uma e tentar proceder uma montagem, seja com anotações, fotos, filmagens, depoimentos, gravações, peças, ou tudo isto numa sequência lógica, para que possamos ter entre indícios e evidências, uma noção clara e objetiva das causas da ocorrência. 

Os parágrafos acima transmitem uma ideia do que é uma investigação de acidente, onde o processo de dará e envolverá muitos procedimentos, análise, pesquisa, busca por respostas, entendimentos de causas e efeitos, para que tenhamos, por meio de ações e atitudes (ativas e reativas) a solução ou o reconhecimento dos fatores que contribuíram para o acidente, levando-se em conta as conclusões da equipe responsável pela elucidação da ocorrência, que certamente trará ensinamentos e providências para evitar outros acidentes.


Observem as inúmeras situações que poderiam influenciar/contribuir para a ocorrência do acidente; mas a pergunta que nos vem à mente é: onde a segurança falhou? Por que falhou? Que fatores humanos conduziram à falha? Como falhou? Mesmo na procura por essas respostas, nosso objetivo é tratar sobre segurança na atividade seja ela qual for, com seus graus de dificuldade, a infraestrutura necessária ao seu desempenho, o conhecimento e treinamento necessário para realizar o trabalho, enfim todo esse aparato técnico-profissional, deve ser analisado, revisado, atualizado e outros critérios que se fizerem necessários, deverão ser utilizados para que a segurança se mantenha em nível aceitável na realização da atividade, seja ela qual for.


Podemos, a partir de agora, tratar e tentar entender o que as expressões Segurança Operacional, aplicada largamente na aviação brasileira em todos os seus segmentos e a Segurança Ocupacional, que é referência para Segurança do Trabalho, têm em comum, além da primeira palavra que é Segurança.


Para tal, vamos conhecer duas definições, sendo a primeira da Segurança Operacional, que é o estado no qual os riscos associados às atividades da aviação, relativas ou em apoio direto à operação de aeronaves, são reduzidos e controlados em um nível aceitável, extraída da Norma sistêmica do Comando da Aeronáutica (NSCA) 3-3, sob o título Gestão da Segurança de Voo na Aviação Brasileira (2013) e a segunda da Segurança e Saúde Ocupacional (SSO) que é uma área multidisciplinar relacionada com a segurança, saúde e qualidade de vida de pessoas nas suas atividades laborais. A segurança e saúde ocupacional também protege todo o público em geral que possa ser afetado pelo ambiente ocupacional, sendo que esta definição foi buscada na internet, para entendimento do assunto em tela.


Nas definições apresentadas, podemos compreender que os termos fundamentais são riscos, operação, aeronave, aceitável, vida, pessoas, proteção, ambiente, ocupacional, saúde, de onde poderíamos elaborar a seguinte frase: Os riscos devem ser aceitáveis para operação de aeronave, visando proteger a vida e a saúde das pessoas, tanto no ambiente operacional e como no ocupacional.      


As comissões de investigação de acidentes aeronáuticos do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (CENIPA), cuja sede está localizada em Brasília, DF, sendo esta uma organização militar do Comando da Aeronáutica (COMAER), que atua como órgão central do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER), sendo que para abranger todo o território nacional, o CENIPA, dividiu o país em sete Serviços Regionais denominados SERIPA, sendo aqui na região Sul, o Quinto Serviço Regional De Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SERIPA V), que tem por missão "Planejar, gerenciar, controlar e executar atividades relacionadas com a Prevenção e Investigação de Acidentes Aeronáuticos da aviação civil na Região Sul".


Para que passamos compor as equipes de investigação de ocorrências aeronáuticas,  é exigida uma formação prévia através de cursos de elementos certificados, realizados pelo órgão central (CENIPA), os quais tratam, não somente da coleta de dados no local do acidente, mas também, da formulação das hipóteses, conclusão e emissões de recomendações; e ainda, durante o processo investigatório, procura-se o entendimento das questões que envolvem a segurança operacional que, muitas vezes, se entrelaça com a segurança ocupacional.


Coloca-se, nesses termos, pois se existem perigos e riscos a serem considerados no planejamento e execução da atividade aérea, ou seja aeronave voando (critérios de segurança operacional), também temos perigos e riscos durante a preparação dessa aeronave antes do voo, no interior dos hangares de manutenção/ oficinas, onde se trabalha, não se voa (critérios de segurança ocupacional), onde em algumas ocorrências ficam claras que, o fator contribuinte ou a sequência de eventos que deram origem aquele acidente, iniciou dentro do hangar ou até mesmo na fabricação da aeronave.


Temos atualmente, na aviação brasileira e internacional, uma quantidade considerável de literaturas, cursos de formação e outras fontes de consulta, para que possamos, através do entendimento dos sistemas, programas e aplicação do gerenciamento dos perigos e riscos operacionais, a possibilidade de conhecer quais os fatores que tiveram maior ou menor participação na ocorrência e como esse conjunto formado por sistemas e programas, poderiam ter sido utilizados para evitar o acidente.



Fig. 01: Postura do mantenedor errada, devido ao banco não possuir apoio adequado.

https://www.aviationpros.com/tools-equipment/maintenance-it/press-release/21131468/winair-winairs-ongoing-service-and-covid19-remote-work-policy 


Para ilustrar, exemplificar as interações e peculiaridades da segurança operacional e ocupacional e,  ainda, trazer ao entendimento do leitor as semelhanças entre as duas na mesma figura acima, podemos observar que a atividade está sendo desenvolvida em um hangar de manutenção de aeronaves de grande porte, com toda a estrutura para execução dos trabalhos, aeronave com o motor aberto, provavelmente sendo cumprido algum procedimento listado nos manuais do fabricante, visando manter as condições seguras de operação do equipamento, ou seja Segurança Operacional. Na mesma imagem o profissional está posicionado na banqueta de maneira inadequada, postura incorreta, sendo que esta condição irá trazer ao colaborador, desconforto ou dores nas costas, devido à falta de atenção à ergonomia, que é um dos riscos ambientais a serem mitigados. Estamos então tratando da Segurança Ocupacional.   

Da mesma maneira que todo esse aparato citado nos parágrafos anteriores são utilizados na segurança operacional, entende-se que a segurança ocupacional, guardadas as devidas proporções e tipos de legislação e formação, tem como objetivo o bem-estar do mantenedor, cuja integridade física e mental é imprescindível, além de evitar danos materiais e pessoais, por vezes muito onerosos.


Pode-se citar uma outra evidência do entrelaçamento das seguranças (Operacional e Ocupacional), que ora estamos tratando, na observação de dois logotipos, os quais identificam, sendo a figura 02 que representa a Fundação Centro Nacional de Segurança, Higiene e Medicina do Trabalho (FUNDACENTRO) e a figura 03 representa o Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER), os quais chamam a atenção, pois representam  a mesma maneira de proteger, os que estão inseridos no contexto, representados por duas mãos estilizadas, no logo da FUNDACENTRO e no logo do SIPAER, onde as mãos aparecem de maneira clara, conforme imagens abaixo:


Fig. 02 – Logo FUNDACENTRO

https://www.google.com/search?q=logo+da+FUNDACENTRO&sxsrf=ALeKk01GHK54au_ze72pDrTc9xLWkFn1UQ:1623900002358&tbm=isch&source=iu&ictx=1&fir=-P6LnSEfiezakM%252Cg-mGNNI5LlT4sM%252C_&vet=1&usg=AI4_-kSFH1fxQKEtEP0FDP-BqVH6hhyHgw&sa=X&ved=2ahUKEwjs2an22p3xAhXCqZUCHSaiCAoQ9QF6BAgDEAE#imgrc=-P6LnSEfiezakM 



Fig., 03 – Logo SIPAER
Arquivo pessoal

        Para reiterar e solidificar, a afirmação de que segurança é base de toda e qualquer atividade seja ela no céu ou no solo, as imagens identificam e reforçam esta afirmativa pois na figura 04, temos uma representação da mitologia grega, na qual Dédalo e Ícaro, para escapar da ilha onde foram aprisionados pelo rei Minos, de Creta, constroem dois pares de asas com penas de pássaros e cera de velas. Porém, após a decolagem Ícaro voou para perto do sol, apesar dos avisos de Dédalo, o calor derreteu a cera, desprendendo as penas e Ícaro, se chocou com o solo vindo a morrer, sendo esse o primeiro acidente aéreo da história da humanidade, que apesar de fazer parte da mitologia, é sempre tratado em qualquer curso de formação e capacitação em Segurança de Voo (Operacional).

Na sequência temos a figura 05, imagem postada na edição 345 de dezembro de 2020, da revista Proteção, cujo artigo escrito pelo Especialista em Direito Trabalhista, Luís Augusto de Bruin, sob o título “Velhos novos ensinamentos.” trazendo uma reflexão sobre as novas condições de gerenciamento dos riscos, onde a imagem da página, nos demonstra que não temos como negar a estreita ligação entre as condições seguras da atividade aérea e trabalhista.


Fig. 04 – Acidente com Ícaro na mitologia grega.



Fig. 05 – Imagem da edição n° 348 da revista Proteção de dezembro de 2020


Neste contexto, não se pode deixar de citar os responsáveis pela confecção, implantação, implementação e continuidade dos programas citados, para desenvolver o gerenciamento, que são os gestores de segurança, quer operacional ou ocupacional, que terão sob sua incumbência, a árdua missão de fazer cumprir os ditames e requisitos das orientações e procedimentos em cada programa, para prover as atividades, para a manutenção de um nível de segurança aceitável e consistente, com entendimento, apoio e a participação de todos, pois a prevenção de acidentes requer mobilização geral.     
  Portanto, como descrito nos textos das Leis, Portarias, Resoluções, Normas Regulamentadoras (NR) e outras legislações, buscam atuar de maneira preventiva, através do cumprimentos de requisitos e procedimentos, visando eliminar qualquer possibilidade de acidente na atividade laboral, sendo que na aviação temos algumas legislações específicas referente não só ao tripulante/ mantenedor envolvido, como aeronave, seus sistemas e toda a infraestrutura (meio ambiente) necessários para o voo seguro, ficando claro que, as expressões segurança operacional e ocupacional, estarão sempre lada a lado.

Para concluir, enfatizo que as legislações afetas às Seguranças Operacional e Ocupacional, não devem ser tratadas sem a consulta e aplicação de todo o aparato de regras e procedimentos previstos, listados em regulamentos, manuais, diretrizes e outros dispositivos legais.
   
Exemplificando temos para a Segurança Operacional, desde os anexos da Organização de Aviação Civil Internacional (OACI), as legislações do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (SIPAER) e da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), que perfazem um número considerável de legislações, tratando desde os fatores humanos até requisitos específicos e técnicos, através dos manuais de operação e manutenção das aeronaves e seus sistemas, evidentemente, com foco voltado às questões e condições de aeronavegabilidade, com ênfase total ao ser humano, pois é uma equipe de profissionais que irão voar e fazer voar, equipamentos modernos lotados de tecnologia e passageiros, que chamamos aeronave.

        Nas figuras abaixo, capas das legislações aplicáveis à Segurança Operacional, para conhecimento:



Fig. 07 – Capa da legislação SIPAER – Norma Sistêmica do Comando da Aeronáutica (NSCA) 3-3 – Gestão da Segurança de Voo na Aviação Brasileira 


Fig. 08 – Capa do Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC) 91, legislação da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC)

Na Segurança Ocupacional, citamos a Portaria 3214/78, a qual traz em seu conteúdo as Normas Regulamentadoras, que balizam e normatizam amplamente a atividade laboral, também com a única intenção de prevenir e preservar vidas humanas e os recursos materiais de empregados e empregadores.                         

 

            Concluímos que, os “caminhos” utilizados pelas Seguranças Operacional e Ocupacional, podem até ser diferentes, porém o objetivo prioritário, será sempre o mesmo, ou seja, o bem-estar das pessoas e a preservação dos bens materiais.

 

Milton Cardoso de Lima

Integrante da Seção de Investigação do SERIPA V



Artigo Revisado por:

 

JOCELYN SANTOS DOS REIS

Diretor Técnico. Manutenção & Segurança de Aviação

 

CARLOS AUGUSTO PEREIRA COSTA

Diretor de Divulgação e Comunicação 


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